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PGR pede condenação de Bolsonaro: quando será julgamento criticado por Trump?

PGR pede condenação de Bolsonaro: quando será julgamento criticado por Trump?

Reuters

 

O procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet, ignorou as pressões do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre a Justiça brasileira e se manifestou pela condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no processo criminal sobre uma suposta tentativa de golpe de Estado.

O PGR apresentou suas alegações finais no processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) no fim desta segunda-feira (14/07), data limite do prazo para a acusação se manifestar.

Gonet pediu a condenação de Bolsonaro por liderar organização criminosa armada; tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano contra patrimônio da União; e deterioração de patrimônio tombado.

A pena pode superar 40 anos caso Bolsonaro seja condenado por todos esses crimes.

Além do ex-presidente, foi solicitada a condenação — com variações nos crimes indicados — de todos outros acusados do chamado núcleo 1 ou "crucial" da trama golpista: Alexandre Ramagem; Almir Garnier Santos; Anderson Torres; Augusto Heleno; Mauro Cid; Paulo Sérgio Nogueira; e Walter Braga Netto.

O pedido de condenação ocorre dias após o governo americano anunciar uma tarifa de 50% sobre as exportações do Brasil aos EUA, justificando a medida como uma retaliação por uma suposta perseguição que Bolsonaro estaria sofrendo na Justiça brasileira — algo que o governo federal e o Supremo refutam.

Horas antes da manifestação da PGR, Bolsonaro postou uma mensagem na rede social X dizendo que o "sistema" busca sua destruição.

"O sistema nunca quis apenas me tirar do caminho. A verdade é mais dura: querem me destruir por completo - eliminar fisicamente, como já tentaram - para que possam, enfim, alcançar você. O cidadão comum. A sua liberdade. A sua fé. A sua família. A sua forma de pensar", escreveu.

A apresentação de alegações finais é a última etapa antes do julgamento e acontece após a instrução processual, em que foram ouvidas testemunhas e interrogados os oito réus acusados de integrar o "núcleo crucial" da tentativa de golpe, incluindo três generais do Exército — o ex-ministro da Casa Civil Braga Netto, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno e o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio.

Agora, haverá prazo de quinze dias para o delator e réu Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, apresentar sua manifestação final. Depois, mais quinze dias para as defesas dos demais réus fazerem o mesmo.

Ao fim dessa etapa, o processo estará pronto para ser julgado, e a expectativa é que isso ocorra no final de agosto ou início de setembro.

Caso Bolsonaro seja condenado, provavelmente cumprirá a pena em prisão domiciliar, devido a problemas de saúde, seguindo o precedente recente da prisão do ex-presidente Fernando Collor.

Segundo a acusação, a tentativa de golpe articulada pelo núcleo crucial teria começado com a campanha contra o sistema eletrônico de votação durante o governo Bolsonaro (2019-2022); seguido com a pressão sobre as Forças Armadas para aderir ao plano e culminado nos ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília em 8 janeiro de 2023.

A movimentação dos réus para tentar manter Bolsonaro no poder após a derrota na eleição de 2022 incluiu reuniões entre o então presidente e comandantes das Forças Armadas para discutir medidas de ruptura democrática, como decretação de Estado de Sítio ou de Defesa, diz ainda a PGR.

Todos os réus negaram que tenham tentado dar um golpe. Bolsonaro reconhece que realizou reuniões com os comandantes das Forças Armadas, mas afirma que não cometeu ilegalidades porque, na sua visão, discutiu apenas alternativas que estariam dentro da Constituição, sem levar qualquer ação adiante.

'Principal articulador e maior beneficiário'

Na manifestação, o procurador-geral descreveu o papel do ex-presidente Jair Bolsonaro na trama golpista.

Segundo ele, Bolsonaro figura como líder da organização criminosa e foi o "principal articulador e maior beneficiário" das ações para tentar implantar um golpe de Estado no país em 2022.

Nas palavras de Gonet, o ex-presidente instrumentalizou o aparato estatal e operou um "esquema persistente" de ataque às instituições públicas e ao processo sucessório após o resultado das eleições presidenciais.

"Com o apoio de membros do alto escalão do governo e de setores estratégicos das Forças Armadas, mobilizou sistematicamente agentes, recursos e competências estatais, à revelia do interesse público, para propagar narrativas inverídicas, provocar a instabilidade social e defender medidas autoritárias", disse o procurador.

Alexandre de Moraes é o relator do caso no Supremo

Crédito,Rosinei Coutinho/STF

Legenda da foto,Alexandre de Moraes é o relator do caso no Supremo

'Retórica golpista'

No documento, Gonet ainda detalha declarações públicas e ações de Jair Bolsonaro que, segundo ele, fizeram parte da "retórica golpista" do ex-presidente.

Segundo o procurador, Bolsonaro teria "escalonado" sua agressividade discursiva ao longo dos anos como parte de um plano para a "corrosão progressiva da confiança pública nas instituições democráticas".

"A deslegitimação seletiva de agentes do Estado — especialmente Ministros do STF e do TSE — cumpria a função de preparar simbolicamente o terreno para ações excepcionais, apresentadas à opinião pública como reativas, e não golpistas", diz o documento.

Gonet ainda usa trechos extraídos de mensagens trocadas entre Bolsonaro e colaboradores e membros de seu governo para apontar seu papel na trama.

"Esses diálogos, extraídos de registros eletrônicos, demonstram que a retórica golpista do ex-Presidente da República Jair Bolsonaro nos discursos públicos era acompanhada por interlocuções diretas com subordinados de confiança, membros da organização criminosa, com quem compartilhava avaliações sobre o timing para ruptura e testava a lealdade de atores-chave, especialmente militares", diz o procurador.

Pena de Mauro Cid

No documento entregue nesta segunda, Gonet também trata das inconsistências na delação premiada de Mauro Cid e sugere uma redução de apenas um terço da pena, e não dois terços a que ele teria direito pela colaboração.

O procurador cita o episódio em que Moraes ouviu o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro novamente, em novembro de 2024, por conta de supostas omissões relacionadas a um plano de matar e sequestrar autoridades, e a informação, que veio à tona em junho deste ano, de que ele teria uma conta ativa nas redes sociais para se comunicar com Bolsonaro.

"Assim, embora não se desconsidere a eficácia pontual de sua colaboração para a elucidação de determinados ilícitos, cumpre reconhecer que os depoimentos prestados por Mauro Cid sobre sua própria atuação nas empreitadas da organização criminosa mostraram-se, em geral, superficiais e pouco elucidativos, especialmente quanto aos fatos de maior gravidade", diz Gonet.

"Diante do comportamento contraditório, marcado por omissões e resistência ao cumprimento integral das obrigações pactuadas, entende-se que a redução da pena deva ser fixada em patamar mínimo. O Ministério Público sugere, na esteira dessa construção, a redução de 1/3 da pena", diz ainda o documento da PGR.

Mauro Cid em depoimento ao STF

Crédito,Ton Molina/STF

Cid foi ajudante de ordens no governo do presidente Jair Bolsonaro. Em setembro de 2023, ele firmou um acordo de delação premiada, em que aceitou revelar supostos detalhes de crimes cometidos pelo ex-presidente o e outros integrantes do seu governo em troca de punições mais leves para si.

Assim, Mauro Cid se tornou uma peça central no processo. Ele também é um dos oito réus acusados pela PGR de integrar o "núcleo crucial" que teria liberado a tentativa de ruptura democrática.

O acordo de colaboração veio após o militar ser preso em maio de 2023, após uma operação que investigava falsificação de cartões de vacinação de Bolsonaro, parentes e assessores. Quando sua delação foi homologada, ele foi solto.

Cid também é investigado por suposto envolvimento no desvio de joias sauditas que Bolsonaro ganhou quando era presidente.

O ex-presidente e outros réus no processo por tentativa de golpe de Estado negam as acusações e suas defesas questionam a credibilidade da delação de Cid.

O acordo também esteve sobre ameaça após o militar ser preso por obstrução de Justiça e descumprimento de medidas cautelares, em março de 2024, e em novembro do mesmo ano, quando a Polícia Federal entregou seu relatório apontando detalhes relevantes que Cid não havia mencionado durante a sua colaboração.

Em especial, o plano "Punhal Verde e Amarelo", que visaria matar, no final de 2022, o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), além do ministro Alexandre de Moraes.

Ao longo do processo, Cid foi interrogado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes diversas vezes.

Bolsonaro e os demais réus negam a existência do plano para matar Lula, Alckmin e Moraes, e dizem que Cid mentiu para evitar nova prisão.

Bolsonaro intensifica pressão por anistia após tarifa de Trump

Apoiadores de Bolsonaro em ato em São Paulo com faixa pedindo "Anistia Já"

Crédito,EPA

Legenda da foto,Família Bolsonaro diz que apenas anistia reverterá tarifa de Trump

O temor da condenação levou Bolsonaro e sua família a uma intensa campanha por sua anistia e de outros denunciados ou condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023. Nessa data, bolsonaristas radicais insatisfeitos com a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes.

A movimentação contra a condenação do ex-presidente também levou seu filho Eduardo Bolsonaro a se licenciar do cargo de deputado federal e se mudar para os EUA, em busca de apoio para o pai junto ao governo Trump.

Foi nesse contexto que o presidente americano anunciou na quarta-feira (9/7) a tarifa de 50% sobre exportações brasileiras, apresentando também como justificativa uma suposta restrição à liberdade de expressão devido a decisões do STF contra plataformas de mídias sociais dos EUA.

O governo Lula, porém, reagiu afastando qualquer possibilidade de ingerência externa na Justiça brasileira, enquanto o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, divulgou uma carta aberta no domingo (13/7) em que refuta as acusações de perseguição a Bolsonaro.

"O STF vai julgar com independência e com base nas evidências. Se houver provas, os culpados serão responsabilizados. Se não houver, serão absolvidos", afirmou Barroso.

Já a família Bolsonaro intensificou a campanha por anistia nos últimos dias, dizendo que apenas a aprovação do perdão pelo Congresso Nacional será capaz de reverter a tarifa imposta por Trump.

Eduardo também tenta conseguir que a Casa Branca adote sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo contra Bolsonaro no STF.

"A única saída para o Brasil se livrar dessa tarifa é com o Alexandre de Moraes recuar. Dentre os vários pontos que o Trump botou, a primeira sinalização efetiva de que há uma vontade de sentar para negociar a tarifa com os americanos é aprovar a anistia", disse Eduardo Bolsonaro ao jornal Folha de S.Paulo nesta segunda-feira.

O STF abriu um inquérito em maio para investigar o deputado licenciado pelos crimes de coação, obstrução de investigação e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, por sua atuação nos EUA.

 

 

 

 

Fonte: BBC NEWS BRASIL

  • Mariana Schreiber
  • Role,Da BBC News Brasil em Brasília
  • Author,Julia Braun
  • Role,Da BBC Brasil em Londres

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