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Proposta de taxar junk food avança no mundo e entra em debate no Brasil

Um número cada vez maior de estudos liga alimentos ultraprocessados a doenças crônicas .

Proposta de taxar junk food avança no mundo e entra em debate no Brasil

Prática, saborosa e sedutora, a comida industrializada revolucionou os hábitos alimentares, especialmente após a Segunda Guerra Mundial, quando potes e pacotes se tornaram populares na rotina de cidades cada vez mais populosas. A vantagem do acesso fácil e, frequentemente, mais barato do que itens frescos e naturais transformou o padrão dietético, colocando fast food, salgadinhos, doces e pratos congelados e instantâneos como presença diária no lar. E o que antes era um banquete, com exageros, se tornou uma armadilha. Os estudos sobre os impactos desse cardápio começaram a mostrar que as altas quantidades de açúcar, sódio e gordura presentes neles cobravam um preço na forma de obesidade, diabetes, problemas cardíacos e outras doenças crônicas.

Essa constatação, principalmente a partir de pesquisas populacionais, se aprofundou nos últimos 15 anos e resultou na revisão dos limites de consumo adequado, compromissos firmados pela indústria para criar produtos mais equilibrados e mudanças na rotulagem. A ideia em comum é frear o consumo excessivo do que os especialistas chamam de alimentos ultraprocessados, que geralmente contêm os principais ingredientes prejudiciais ao organismo. Cientes de que talvez isso não seja suficiente para mudar o comportamento alimentar, vários países começaram a estudar ou adotar impostos sobre esses produtos - uma ideia que voltou a ganhar força no Brasil durante a Reforma Tributária.

O fato inegável é que as pessoas passaram a comer cada vez menos arroz com feijão e pratos regionais para se satisfazer com a praticidade e o sabor dos produtos prontos. O problema não está na ingestão ocasional, mas sim quando os ultraprocessados dominam o cotidiano - o que tem sido observado globalmente. Pesquisas realizadas no Brasil mostram um efeito devastador dessa tendência. Um artigo científico atribui 10,5% de todas as mortes prematuras entre os brasileiros em 2019 ao consumo desenfreado de comida industrializada. Mais recentemente, outro estudo evidenciou que nem mesmo o cérebro escapa do abuso: ele aumenta o risco de declínio cognitivo. A ameaça, na verdade, começa mais cedo, na infância e adolescência. Um estudo americano com mais de 3.500 jovens mostra que 63% deles apresentavam maior propensão à gordura visceral, um fator de risco para hipertensão e diabetes. O principal fator por trás disso é a alimentação desequilibrada.

A matemática não é difícil de entender: mais alimentos ultraprocessados e menos frutas e verduras na rotina parecem ser uma fórmula que resulta em ganho de peso e doenças crônicas. Por isso, as recentes diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) reforçam a necessidade de inverter esse padrão. Como mudar o comportamento alimentar é uma tarefa difícil, os países têm adotado a taxação de produtos como forma de desestimular o consumo e utilizar os recursos extras para investir em outras medidas de prevenção e combate à obesidade. O aumento de impostos sobre produtos açucarados já foi adotado pelo Chile, México e mais de 80 nações. O Reino Unido possui um imposto sobre refrigerantes desde 2018 e registrou uma queda de 8% na taxa de obesidade em crianças nos primeiros 19 meses após a implementação.

No Brasil, as propostas de redução de nutrientes críticos pela indústria e de alteração dos rótulos avançaram, agora exibindo alertas para os consumidores em forma de lupa. Mas há quem defenda ir além. "É necessário tributar os produtos prejudiciais e subsidiar a cesta básica com alimentos minimamente processados para a população mais vulnerável", afirma o pesquisador Eduardo Nilson, do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP. É nessa direção que a discussão sobre novas alíquotas segue, impulsionada pelos movimentos da Reforma Tributária, que ainda está avaliando a isenção para itens da cesta básica. Essa ideia não agrada aos fabricantes, que acreditam que as taxas já são altas e que os malefícios são resultado do consumo excessivo. "Se houvesse algum produto que não pudesse ser consumido, seria proibido. Defendemos o equilíbrio", diz João Dornellas, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia).

Enquanto esse debate acalorado continua, os profissionais de saúde continuam a enfatizar a importância de "desembalar menos e descascar mais".
JÁ IMPLEMENTARAM ALGUM NÍVEL DE TAXAÇÃO ATÉ 2022
BRASIL Novas regras de rotulagem entraram em vigor no ano passado e alimentos industrializados precisam indicar alto teor em açúcar, gordura saturada e sódio. Conselho Nacional de Saúde recomendou que a Reforma Tributária implemente alíquotas mais altas para produtos nocivos à
saúde, como ultraprocessados
CHILE Cobra impostos desde 2014 sobre refrigerantes,
energéticos, bebidas adoçadas e águas saborizadas. Os rótulos de alimentos têm de indicar presença de sódio, gorduras saturadas e açúcar em excesso e é vedada a
publicidade voltada ao público infantil
MÉXICO Desde 2014, conta com um imposto focado em bebidas açucaradas e alimentos com alto teor calórico. A alíquota é de, aproximadamente, 10% do valor do produto, nova rotulagem entrou em vigor a partir de 2019.

REINO UNIDO O imposto da indústria de refrigerantes entrou em vigor em 2018 e prevê isenção apenas para produtos
com menos de 5 g de acúcar por 100 ml
ESTADOS UNIDOS FDA propôs atualização dos critérios para que alimentos possam ser considerados saudáveis e dos rótulos com informações nutricionais na parte frontal em 2022.

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